A polícia do regime diz que abriu um inquérito para investigar acusações de que agentes daquela força irromperam, segunda-feira, pelo interior de uma igreja de Luanda onde se concentravam populares que pedem a libertação de 15 activistas detidos desde Junho.
A informação foi avançada pelo porta-voz do comando provincial de Luanda da Polícia do regime, inspector-chefe Mateus Rodrigues, e surge, explicou, após “denúncias públicas”, nomeadamente nas redes sociais, sobre a entrada de agentes policiais na igreja de São Domingos, na capital angolana, “para prenderem” pessoas no seu interior.
Ao que parece, os agentes entraram de facto na Igreja apenas para assistirem à missa, como bons devotos, bem como para rezar em prol da longevidade do seu ídolo carismático, também conhecido como o “escolhido de Deus”.
Também não prenderam pessoas. Limitaram-se a levar temporariamente para parte incerta alguns dos presentes que, por faltarem às aulas de educação patriótica, perturbavam a concentração religiosa dos que, devotamente, assistiam à homilia.
Em causa estão alguns populares, de várias idades, incluindo outros jovens activistas, que reclamam a libertação do grupo de 15 elementos detidos por suspeita de pensarem na preparação de um golpe de Estado e de um atentado contra o Presidente Eduardo dos Santos e que assistiam a uma celebração eucarística naquele templo.
“Nós não confirmámos essa informação [entrada dos agentes da Polícia Nacional na igreja], mas como foi uma denúncia pública foi aberto um inquérito para aferir o que realmente ocorreu. Também não é prática da nossa polícia [entrada na igreja]”, disse ainda o inspector-chefe Mateus Rodrigues.
E disse bem. Mas, afinal, os polícias entraram pacificamente, ajoelharam-se e rezaram, pelo que não se vê que tenham cometido qualquer abuso de poder. Foi, aliás, uma manifestação cívica que é de enaltecer…
O oficial da Polícia Nacional garantiu ainda que não foram feitas detenções no exterior do mesmo templo, durante a celebração eucarística – que segundo as mesmas denúncias teria sido interrompida pela acção dos agentes -, que foi anunciada nas redes sociais como forma de voltar a apelar à libertação destes 15 elementos e em solidariedade com um desses detidos, Luaty Beirão, em greve de fome há 23 dias.
“Não tem qualquer sentido essa informação”, afirmou o inspector-chefe Mateus Rodrigues. E é verdade. Embora esteja a decorrer o inquérito, este Inspector-chefe já sabe que não faz sentido. E não faz mesmo. Alguém imagina a Polícia Nacional do regime a invadir uma Igreja e a prender os arautos da rebelião, dos atentados, dos golpes de Estado e todo uma panóplia de violações da democracia e do Estado de Direito?
Os relatos dos participantes nesta eucaristia, que no final envolveria nova vigília no exterior, denunciaram que alguns elementos foram levados pela polícia e libertados pouco depois.
Os jornalistas viram no local um forte cordão policial. Não conseguiram, é claro, perceber que eles estavam ali apenas para ir à missa. Apenas isso. Já não se pode ser um bom cristão?.
“Foi uma medida cautelar, uma medida preventiva, tendo em conta que algumas pessoas envolvidas nessa vigília já têm um histórico de violência”, explicou ainda o porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional do regime.
Este novo incidente surge depois de uma forte mobilização policial no domingo para a igreja da Sagrada Família, também em Luanda, onde cerca de uma centena de pessoas se concentraram em vigília pelos mesmos motivos, mas que acabaram por pacificamente abandonar o local por recearem a intervenção da polícia.
Essa desmobilização aconteceu quando este grupo estava rodeado por dezenas de elementos da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), incluindo um camião para lançamento de água já posicionado em frente – com as ruas envolventes cortadas ao trânsito automóvel – além de brigadas caninas.
Os participantes, em silêncio, envergavam então peças de roupa branca, velas e cartazes com dizeres apelando à libertação dos 15 jovens e em solidariedade com Luaty Beirão.
Essa foi então a quarta vigília a realizar-se nas escadarias daquela igreja, a principal de Luanda. Contudo, após a mobilização policial de domingo, os participantes tentaram fazer uma concentração, em moldes semelhantes, mas na igreja de São Domingos, a poucos quilómetros de distância.
Além de Luaty Beirão, permanentemente invocado nestes protestos dada a sua saúde, os participantes alertaram para o caso de Nélson Dibango, outro dos 15 detidos neste processo e que iniciou também uma greve de fome nos últimos dias.